15 de outubro de 2014

Nota pública da diretoria da Associação Brasileira de Ensino do Direito (ABEDi) contra o PL nº 5.749/2013

O Congresso Nacional discute hoje o Projeto de Lei no 5.749/2013, de autoria do Deputado Sérgio Zveiter (PSD-RJ), que altera a Lei 8.906, de 04 de julho de 1994, dispondo sobre a criação da figura do “paralegal”. Nos termos da proposição parlamentar, o bacharel em Direito, que comprove essa condição com um “diploma ou certidão”, desde que prove “idoneidade moral” e faça o requerimento na Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), terá direito à inscrição como “paralegal”.

O “paralegal”, de acordo com o PL no 5.749/2013, poderá praticar atos privativos de advogado, desde que “em conjunto” e “sob a responsabilidade deste”. Na exposição de motivos, o autor do projeto deixa explícito qual a razão da norma: haveria aproximadamente 5 milhões de bacharéis em Direito no Brasil e muitos deles, “após dedicarem cinco anos de suas vidas, com grande investimento pessoal e financeiro, descobrem-se vítimas de verdadeiro estelionato educacional”. Tal circunstância seria comprovada pela reprovação dos candidatos no Exame de Ordem. O modo de solucionar esse problema estaria em “conferir status jurídico, perante a OAB, ao bacharel que ainda carece desse requisito fundamental à sua inscrição como advogado: a aprovação no Exame de Ordem”.

A Diretoria da Associação Brasileira de Ensino do Direito (ABEDi), que reúne pesquisadores da área do ensino e da pesquisa jurídica no Brasil, vem a público, por meio desta nota, manifestar-se contrariamente ao PL no 5.749/2013, por entender que ele não soluciona os problemas da educação jurídica brasileira.

O Brasil enfrenta um grande problema relacionado à expansão da oferta de cursos de direito. Essa expansão tem-se traduzido em uma ampla gama de egressos que não conseguem acessar à advocacia e que não logram aprovação em concursos públicos nos quais não seria exigida a prática jurídica. É um grave problema social e econômico. A solução evidente é a melhoria de qualidade nos cursos jurídicos, que precisa ser estimulada por ações governamentais específicas.

O Congresso Nacional é o depositário da soberania popular e a sua legitimidade para editar normas não pode ser questionada. Trata-se de um postulado da democracia que os conflitos sociais tenham seu desaguadouro natural no Parlamento. A iniciativa do PL no 5.749/2013 deve ser respeitada como uma tentativa de se oferecer uma resposta ao sério problema dos egressos dos cursos jurídicos que não conseguem admissão nos exames profissionais, de entre estes não apenas o Exame de Ordem.
Respeitar a iniciativa dos membros do Congresso Nacional não se confunde, porém, com a concordância com seu conteúdo e não impede o exercício do direito de crítica de associações e entidades. Nessa chave é que a Diretoria da ABEDi reafirma sua posição de que o PL no 5.749/2013 não resolverá os problemas a que se propõe eliminar. Ao contrário, ele possui o risco de agravar o quadro atual, sob diversos fundamentos:

1. Em primeiro lugar, não existem diagnósticos claros sobre o mercado de trabalho na área jurídica. Neste problema, como em tantos outros sobre o Direito, faltam dados objetivos e estatísticos confiáveis, o que torna qualquer discussão nesse sentido uma mera exposição retórica de impressões e de manifestações pessoais marcadas pelo subjetivismo.

2. Em segundo lugar, a figura profissional – após as modificações no projeto original – não se assemelha aos assistentes jurídicos de outros países, já que aqueles constroem uma carreira técnica em grandes firmas de advocacia, ao passo em que a figura proposta possui um limite temporal de três anos.

3. Em terceiro lugar, o debate tem sido feito sem dimensionar como a figura do “paralegal” se relacionaria com o curso de graduação. Se o projeto de lei se funda na deficiente formação nos cursos de Direito para criar o “paralegal”, em momento algum ele oferece soluções para o que considera a causa para a criação desse novo agente. Trata-se de se identificar um sintoma e não combater as causas da patologia, algo bastante comum no debate de políticas públicas no Brasil.

Com base nestes motivos, a Diretoria da Associação Brasileira de Ensino do Direito (ABEDi) não pode se furtar a indicar que diverge do PL no 5.749/2013 e apoia as organizações, os professores e estudantes que se colocaram de modo crítico contra seu conteúdo. A sociedade brasileira quer e precisa discutir o futuro das profissões jurídicas. Antes, porém, é necessário definir que tipo de educação jurídica nós queremos para as próximas décadas.

Com respeito à soberania parlamentar e compreendendo as razões que levaram à apresentação do PL no 5.749/2013, mas delas divergindo de maneira honesta e frontal, a Diretoria da ABEDi coloca-se ao dispor do Congresso Nacional para o debate sobre o “paralegal” e outras questões relevantes sobre o Direito e a formação jurídica.

A DIRETORIA